sábado, 26 de mayo de 2007

A ARTE DE FAZER ENTREVISTAS

Esse lance de procurar emprego nunca me agradou, na verdade, nem o lance de trabalhar, e descobri recentemente que eu levo jeito é pra vagabundo mesmo.
Mas como dinheiro não dá em árvore e seguro desemprego são só cinco parcelas, lá vou eu atrás de mais um emprego idiota. E digo “idiota” porque quando você não faz o que quer, você só pode ser um cara imbecil, e acreditem, eu sou um.
Depois de três meses em casa vagabundando (e a grana acabando) achei necessário a minha volta ao mercado de trabalho, mas nada que desse muito trabalho.
“Sete dias gratuitos.” Quem nunca viu isso? Eu vi e entrei.
Nada mal, algumas entrevistas em apenas uma semana, minha área não está tão ruim assim, esse site não é de todo mal.
Engano meu, depois de sete dias lá está o débito na minha conta. Tudo bem que o erro foi meu por não ler o e-mail que eles mandaram...
Que seja! Entrevista marcada pra sexta-feira e lá vou eu.
Acordo cedo (coisa que eu me desacostumei), aparei a barba (cortar tudo jamais!), me vesti de palhaço (calça social e camisa por fora da calça, claro) e lá fui eu com um currículo embaixo do braço pra droga do lugar.
Lugarzinho bacana, bem localizado e sem a cara de escritório, é o típico lugar que quando você passa na frente não sabe bem o que é na verdade.
Cheguei ao lugar às dez da manhã. Primeira uma entrevista com uma psicóloga (?) que depois me mandou fazer uma porrada de testes idiotas, coisas com riscos e figuras, e fora um questionário sobre perguntas pertinentes a minha “profissão” que eu realmente não soube responder, sou um péssimo funcionário. Já estava ficando realmente chateado com aquilo tudo, e pensava o que aconteceria se eu simplesmente levantasse e fosse embora. Acho que as coisas poderiam ser bem melhores se eu tivesse feito isso, mas o que eu tinha a perder? E eu não estaria aqui escrevendo isso. Então fiquem agradecidos por eu ter ficado lá.
Depois de entregar um texto sobre a “arte de ficar em casa” chegara a hora do almoço.
- Por favor, volte daqui a uma hora para fazer a entrevista com o chefe.
Almocei e depois de uma hora voltei.
Filho da puta. Me deixou esperando por mais de uma hora. Será que isso fazia parte do teste? Acho que não.
Me chamaram e lá fui eu na sala do cara.
Ele se parecia com qualquer outro chefe metido a besta de filmes hollywoodianos, e eu não fiquei nada surpreso com isso.
Apresentamos-nos.
- Nós somos uma empresa – começou ele – que tem mais de mil e quinhentos funcionários, somos a maior do nosso ramo, com filiais por toda São Paulo, Rio e Paraná.
Grande coisa. Odeio quem se gaba pelo emprego que tem, se ele ainda fosse dono daquela merda toda, mas nem isso ele era.
- Quando você terminou o segundo grau? – perguntou ele.
- Em 2001.
- E não pensa em fazer nenhuma faculdade?
- Eu sempre achei que uma pessoa não precisa de uma faculdade pra ser alguém na vida – respondi. Na hora eu pensei no Bukowski, mas ele não é um bom exemplo. Depois pensei no meu pai, era um exemplo pior ainda.
- Olha filho...
Ele era meu pai e eu não sabia?
- Eu também tinha duvidas sobre o que fazer quando tinha a sua idade, mas depois eu decidi por Administração de Empresas com Ênfase em DEPARTAMENTO PESSOAL. Estou nessa área há DEZOITO ANOS. Conheço TUDO sobre departamento pessoal.
Como todo mundo que não sabe o que fazer ele também fez administração atrás de dinheiro. Eu juro que ele salientou todas essas palavras como se fosse alguma coisa importante, pra mim não era. O cara realmente se achava grande coisa.
Depois de mais perguntas, e ele ainda ressaltou que eu não fui muito bem nas questão sobre a minha “função”, ele disse:
- Bem, vejo pelo seu currículo que você está desempregado há uns três meses?
- Certo.
- E que está querendo voltar ao mercado de trabalho.
Silêncio.
- Você não está querendo voltar ao mercado de trabalho? – Insistiu ele.
Mais silêncio.
- Então...?
- Bem, querer trabalhar eu não quero... – comecei.
- Você não quer trabalhar? – perguntou ele confuso.
- Exatamente. Eu não quero trabalhar, mas eu preciso trabalhar. Infelizmente não nasci rico, entende?
Silêncio de novo. Agora por parte dele.
- Sei... – respondeu ele com cara de bobo. E ele nem precisava se esforçar muito.
Sinceridade acima de tudo, eu sempre pensei assim. Ninguém mandou ele fazer a pergunta errada. A culpa, se é que ela existe, era dele, e não minha.
- Entendo, entendo. Então, eu tenho mais uns três candidatos a entrevistar...
Foi aí que eu saquei que ele estava mentindo, safado. Nem pra dizer a verdade e falar que não tinha gostado de mim, e nem das minhas respostas.
- E na semana que vem – ele continuou – eu ligo pra você. Boa tarde.
Me levantei e nem me dei ao trabalho de apertar a mão dele.
Abri a camisa, arregacei as mangas, coloquei meus óculos escuros e fui pra casa feliz e contente, com a sensação de que fora um trabalho bem feito.
Adivinha se eu consegui o emprego?

CICATRIZ

Eu estava lendo Bukowski sentado na privada quando li que ele mesmo achava que tinha mãos bonitas, então olhei para as minhas. Elas são legais, grandes e um pouco peludas, e fora a cicatriz que eu tenho próxima ao dedo mindinho na mão direita tudo estaria perfeito. A cicatriz se encontra no exato lugar onde a mão fechada em forma de soco atinge alguém, ou alguma coisa e, no meu caso, foi a segunda opção.
Foi numa festa à fantasia onde se encontravam algumas milhares de pessoas, todas muito bêbadas. Não que festas à fantasia me interessem, mas o fato de ser open bar sempre me interessa, e se você for macho o suficiente, não importa o quanto você pague, você sempre dará prejuízo. Não que a gente tenha pagado alguma coisa (a namorada de um amigo meu arranjou algumas entradas grátis), que seja, o importante é que só tínhamos que nos preocupar com as fantasias. Fomos à uma loja de fantasias na Vergueiro que se mostrou um dos lugares mais interessante da minha vida (cada roupa que colocávamos era mágico, nos transformávamos em outras pessoas, sei que isso parece gay, mas é verdade) e depois de muitas horas saímos de lá com duas fantasias de Jedi (uma minha), e uma de conde drácula (a namorada desse mesmo amigo já tinha descolado a fantasia dela de princesa).
Antes de irmos paramos numa lanchonete chique para comermos (também de grátis). Foi interessante a gente andando no meio do lugar todos fantasiados e as pessoas olhavam com um ar de “o que esses caras tão fazendo aqui com essas roupas?”, eu estava achando tudo o máximo.
(Agora chegamos na parte interessante.)
Chegamos ao lugar embaixo de uma puta chuva, isso depois de ficarmos perdidos no centro, mas chegamos. Primeira coisa a se fazer quando você se encontra num lugar que você acha uma merda é encher a cara, e como era open bar, bem, vocês já devem imaginar o estrago. Fui direto pro rum, bebida de piratas, e bebi vários copos, acho que aquele foi o primeiro dia que eu tomei rum.
No começo eu estava achando tudo aquilo uma merda, caras mais musculosos que eu e com cara de boyzinhos; minas com cara de vagabundas que só ficariam comigo bêbadas, mas nunca sãs; som horrível tipo eletrônico; mas sabia que tudo isso passaria depois que o rum fizesse efeito, então bebi mais. E meus amigos também,
(Agora chegamos na parte em que o título faz algum sentido.)
Como aquilo tudo estava demorando demais pra fazer efeito, eu pedi uma dose de copo cheio (e era um Sr. copo) e decidi virar tudo de uma vez. Segurei no braço do meu amigo pra não vomitar e lá fui eu virar todo o líquido dourado pra dentro da goela. O baque que a bebida fez ao bater no fundo do meu estômago foi quase sonoro, e me segurei muito pra não vomitar. Depois de alguns segundos não deu outra, tinha que dar porrada em alguém pra aliviar a dor (não é bem uma dor, se você bebe você sabe bem do que eu tô falando) e como eu não tava nem um pouco afim de arranjar briga com os caras de lá e eu não queria bater no meu amigo (que provavelmente revidaria) eu dei uma porrada na primeira coisa que eu vi na minha frente, no caso um extintor de incêndio. Não precisa ser muito esperto pra saber quem se deu mal nessa, mas o mais importante é que eu não senti nada e fiquei lá curtindo o efeito do álcool pré ingerido quando meu amigo disse “Cacete Boi, olha a sua mão!”, e não é que ela estava cheia de sangue!
Fui correndo ao banheiro e não deixei meu amigo ir junto comigo, pois ele tinha que vigiar a namorada dele e nosso outro amigo que era magrinho e estourado.
Chegando ao banheiro me deparo com uma puta fila, que merda! Eu não tava afim de ficar plantado numa fila de banheiro, eu nem sequer queria mijar. Um segurança viu minha mão e me chamou pra um canto. Eu disse que estava tudo bem, mas o cara insistiu em me levar pra fora pra lavar a mão. Eu já estava pensando que das duas uma: ou eles iam me jogar pra fora por eu ter brigado (eu ainda expliquei pra eles que eu havia batido num extintor de incêndio...), ou eles iam me encher de porrada. Nenhuma das duas, o cara foi gente fina pra caramba, lavou meu machucado e me encaminhou pra enfermaria.
Chegando lá tinha um monte de gente bêbada vomitando em tudo quanto era lugar e me pediram para me sentar em cima da maca para ser atendido. Sentei e a droga da maca desmontou, e lá fui eu pro chão do lugar. O lance que eu achei tudo aquilo muito engraçado e fiquei lá dando risada da minha cara e nem me dei ao trabalho de me levantar, mas a enfermeira sim; ela me ajudou a levantar e arrumou a maca de novo pra que eu pudesse sentar. Ela também achou engraçado, na verdade todo mundo que não estava desmaiado achou engraçado. Ela limpou meu machucado e quando ela me perguntou onde eu havia conseguido eu disse que tinha arrebentado a cara de um safado qualquer, pelo menos ela acreditou, se eu tivesse falado do extintor de incêndio ela não ia acreditar mesmo.
Certas palavras me dão arrepios, barata é uma delas, agulha é outra.
- A gente vai ter que dar uns pontos nesse machucado.
- Pontos? Meu Deus! Com agulhas?
- Com o que mais eu poderia dar?
- Cacete!
Como a bebida já estava fazendo efeito preferi não discutir. Eu abaixei a cabeça depois que vi a agulha da anestesia e quando ela aplicou tudo o que eu fiz foi gritar “Ai!”.
- Nossa! Um homem desse tamanho gritando por causa duma agulha dessas!
Depois disso eu não senti mais a minha mão. Era engraçado, ela fazendo os pontos (levei três), eu sentido a agulha entrando na pele e mesmo assim não sentindo dor alguma.
Agradeci a ela e sai da enfermaria com o nível de álcool altíssimo no sangue. Agora a bebida tinha feito efeito.
Andei alguns metros e vi meus amigo ali por perto, e antes de chegar até eles agarrei a primeira mulher que passou na minha frente, era bonita. Ficamos.
Depois dela apareceu mais uma, não que ela fosse bonita, mas pelo menos era mulher.
Depois disso eu não lembro de mais nada...
(Agora vem a parte engraçada.)
Acordei com o meu amigo me chamando.
- Boi!
- Que é Beavis? Me deixa dormir caralho.
- A gente tá na frente da sua casa.
Abri os olhos. Não é que estávamos mesmo!
- Cadê a Amanda?
- Deixei ela em casa.
- Cadê o Gustavo?
- Tá babando aí do seu lado.
E não é que estava mesmo!
Saí do carro. Meu amigo também, o outro continuou dormindo.
Quando cheguei no portão e coloquei a mão no bolso descobri que a chave não estava onde deveria estar.
- Peraí que eu pego pra você – disse meu amigo. Um grande cavalheiro se me perguntarem.
O safado entrou no carro e dormiu.
O outro que estava dormindo no banco de trás acordou. Saiu do carro e veio me perguntar o que estávamos fazendo lá parados, eu expliquei a situação.
Então tive a grande idéia de querer pular o muro, pedi pro meu amigo ajudar.
Ele fez o famoso “pézinho” e lá fui eu dar uma de homem-macaco. A equação que se seguiu é bem fácil: pouca habilidade + grande maça corporal = chão na certa; e lá fui eu dar de cara com a calçada, e com isso eu abri um rasgo na sobrancelha.
Meu amigo se limitou a dar risada da minha situação, um outro grande cavalheiro se me perguntarem.
Como estava me sentindo ridiculamente patético e terrivelmente bêbado preferi, como já fizera na enfermaria, ficar pelo chão mesmo e dar risadas.
Depois de um tempo, do nada, um gatinho branco apareceu e começou a se enroscar na minha perna, fiquei um tempão brincando com ele na calçada, e meu amigo também.
Foi mais ou menos nessa hora que o cara que estava dormindo bêbado dentro do carro despertou, e por pura mágica, achou minha chave.
Nos despedimos e fui pra cama dormir um pouco.
(Depois de muitas horas.)
Acordei só de cueca na cama e com as minhas roupas todas jogadas pelo quarto, na verdade acordei porque estava com uma puta dor na mão, e quando abri os olhos me lembrei do que havia acontecido, bem, na verdade havia uma grande lacuna na noite, por isso liguei pra um dos caras.
- E aê cara, tá vivo?
- Acho que sim, apesar de estar tudo doendo. O que aconteceu depois que eu saí da enfermaria?
- Pô cara, a Amanda disse que viu você com várias minas depois disso, bebeu mais um pouco e ficava mijando em todas as colunas do lugar, mijou até no carro que estava do lado do meu lá no estacionamento. Depois entrou no carro e apagou.
Mesmo bêbado eu não perco a postura, continuo um cavalheiro. As pessoas que me viram mijando devem ter achado a mesma coisa.
- E as minas eram bonitas pelo menos?
- Não cara, a maioria não era.
- Valeu cara, te ligo mais tarde.
Depois de um banho fui me juntar ao meu pai na cozinha, ele nunca viu os pontos, nem percebeu o rasgo na minha testa.
- A nossa cachorra matou um gato hoje de manhã.
- Sério? – fiquei chocado. – E como que ele era?
- Branco. Parecia um filhote.
Merda! Por culpa minha. Ou o gatinho gostou muito de mim e quis pular na minha casa pra brincar depois e acabou encontrando a morte na boca da minha cachorra, ou eu bêbado coloquei ele no bolso da calça pra brincar depois e minha cachorra puxou o bichano e eu nem vi. Preferi não pensar muito no assunto, fiquei mais mal por causa do gatinho do que pela ressaca. Sonho com o gatinho branco até hoje.
Bem, fora essa cicatriz que eu ganhei nesse dia e o corte no dedão embaixo da unha da mão esquerda, tudo estaria perfeito. O corte eu ganhei depois de enfiar a mão na boca de um amigo semi-bêbado atrás de um pedaço de pizza que por direito era meu, mas isso é outra história.

DA SÉRIE UMA NOITE NUM PUTEIRO DE VINTE REAIS

Mais uma noite perdida para a bebida, não que isso seja ruim de qualquer jeito.
Voltamos pra casa a pé seguindo a linha do metrô como sempre fazíamos, até chegar em casa são umas seis estação e sendo umas onze horas, ainda se viam alguns bares abertos. Decidimos pagar pedágio em cada um deles, com pinga.
Lá pela quarta estação já estamos felizes e sorridentes.
Depois de tomar mais uma (só eu dessa vez, meu amigo já desistiu) na próxima estação decidimos ir ao bingo, fazemos isso frequentemente, eu, particularmente, nunca ganhei um centavo com isso.
O nosso maior problema com bingos era que sempre íamos quando estávamos bêbados, e isso é uma merda se você quer ganhar alguma coisa. Os números a sua frente simplesmente se multiplicam.
Desistimos depois de duas ou três partidas e decidimos seguir caminho.
Um amigo nosso passa de ônibus, nos vê e desce.
- Caralho – disse ele.
- Caralho – eu disse.
- Vocês estão indo pra onde?
- Pra casa.
- Vambora então.
Existe uma avenida onde só existem travestis e putas ali perto, decidimos desviar do nosso caminho e ir pra lá. É a boa (?) e velha (!) Avenida Indianópolis.
Logo no começo tinha uma barraca que vendia bebidas e paramos lá pra conversar um pouco.
Dessa vez nós três pedimos maria-mole.
Conversa vai, conversa vem, eu e o cara que estava comigo desde o começo já começamos a ficar realmente bêbados, quando dois travestis pararam ao lado da barraca e começaram a fumar maconha.
Por que não?
- Opa, posso dar uns dois aí?
- Claro, gracinha.
Fumamos os cinco e foi o pior baseado que eu fumei, muito ruim mesmo, parecia que tinha estourado meu pulmão. Depois mais pra frente todos nós concordamos com isso.
Pra não dizer que eu sou ingrato, pago uma maria-mole pra dupla de travecos e saímos dali.
Quando passamos perto da casa do cara que chegou depois ele foi embora.
- Bicha! – nós gritamos quando ele descia a rua.
Bem, éramos ainda nós dois, eu e o cara que estava comigo desde o começo.
Chegamos à última estação, mas ainda era um bom caminho até em casa, o metrô é que tinha acabado.
Já estávamos muito loucos e não tinha nada melhor pra fazer mesmo. Fomos num puteiro.
Era uma e meia da manhã quando chegamos.
A casa sendo meio nova, estava meio vazia, fazia sentido.
Eu não agüentava ficar em pé, por isso fui me sentar em cima duma mesa de bilhar que tinha lá nos fundos. Depois de um tempo falei pro meu amigo:
- Cara, vai lá e me escolhe uma que você achar melhorzinha e vamos acabar logo com isso.
Eu apaguei.
Depois de um tempo, meu amigo voltou com duas garotas, uma pra mim e a outra pra ele.
Eu não estava em condições de ver se ela era bonita ou feia, e também não me importava muito.
Depois de nem cinco minutos de conversa fomos os dois para os respectivos quartos, que diga-se de passagem, era um do lado do outro.
- Só um minuto gatinho que eu vou lá pegar minhas coisas.
Que mania mais feia ficar chamando os outros de gatinho.
A outra que estava com meu amigo também saiu do quarto.
- Aê, seu merda – gritei.
- Aê, pinto frouxo – ele respondeu.
Enquanto esperava percebi que aquilo ali já fora antes um quarto só, e que só havia divisórias de madeira nos separando, e as divisórias não chegavam até o teto.
Em pouco tempo as duas voltaram e começamos a fazer o que pagamos pra fazer.
Não haviam mais palavras nos quartos, só gemidos.
Eu tava indo bem quando do quarto do meu amigo vieram algumas risadas.
- Você tem alguma camisinha aí com você? – perguntou a puta do meu amigo pra minha puta.
- Putz, nem tenho.
- Droga, vou ter que ir lá pegar mais uma então.
A porta se abriu e logo se fechou.
- Tá tudo bem aí, cara? – perguntei.
- Tranqüilo, continua aí.
Eu continuei.
Depois de alguns instantes eu ouço:
- Aê, bunda branca, tá indo bem.
Olhei pra trás e vi meu amigo pendurado na divisória me olhando.
- Tá gostando cara?
- Preferia que fosse comigo, mas você tá indo bem. Posso entrar aí junto?
- Nem fodendo!
Ficamos ainda falando merda até a puta dele voltar, eu não tinha nem tirado o pau daquela buceta enquanto conversávamos.
Acabou tudo bem, os dois gozaram e logo estávamos do lado de fora, na rua.
- E aí, como foi – ele começou.
- Foi do caralho, muito bom. E a sua?
- Nossa, maravilhosa.
- Estranho – notei depois de alguns passos - o céu tá meio claro, né?. Que horas são?
- Caralho cara! Já são quase cinco da manhã!
- O quê? Não pode ser.
Olhei no meu celular.
- Puta que pariu! Era uma e meia quando entramos. Pagamos por meia hora... Onde, caralhos, enfiamos as horas restantes?
- Não me pergunte cara, acho que foi na bunda daquelas putas...
Até hoje achamos que entramos em algum tipo de portal naquela noite, as horas perdidas não faziam sentido e nunca mais voltaram, igual a todas as outras horas perdidas, mas nesse caso foi diferente.
- Ainda bem que estamos perto de casa.
- Só.

DESTILADOS

O cara mais idiota do mundo estava sentado pensando em quão idiota ele era, mas não chegou a conclusão alguma, mas mesmo assim resolveu tentar.
Tudo o que havia feito era estudar e estudar, queria ser médico, afinal seu pai também era médico.
Entrou no primeiro bar e pediu uma dose de whisky, era isso o que Clint Eastwood bebia naquele filme com o Morgan Freeman, aquele de faroeste. Isso, esse mesmo.
Virou o copo sem pensar duas vezes, mas deveria ter pensado, porque depois foi correndo vomitar no banheiro.
Ele achou que assim pareceria um cara durão, mas descobriu que não era, pois além de não estar no velho-oeste, não andava a cavalo e nem tinha uma arma na cintura.
Voltou, se endireitou, olhou em volta, ouviu algumas risadas, mas não se importou. Só não entendia o porquê do Clint Eastwood não fazer careta quando bebia, parecia que até gostava.
Tentou de novo, mas agora pediu rum, era isso o que o Johnny Depp bebia naquele filme com o Legolas, aquele de piratas. Isso, esse mesmo.
Virou o copo, mas pensou duas vezes, o que no final das contas descobriu que não fazia a menor diferença, foi correndo ao banheiro.
Ele pensou que assim pareceria durão, mas descobriu que não, pois além de não estar num barco, ele continuava sem uma arma na cintura (mas agora pensava numa arma daquelas antigas). Será que um papagaio resolveria a questão? Decidiu que não.
Voltou ao balcão e pensou no que estaria fazendo de errado. Será que estava se baseando nos filmes errados? Decidiu tentar algo mais brasileiro. Pediu uma dose de pinga.
O garçom olhou feio enquanto enchia o copo, era ele quem provavelmente limparia o banheiro.
Antes de virar o copo ele sabia que, pelo menos, não fazia diferença nenhuma se ele pensava ou não na coisa. Preferiu não pensar em nada.
Virou o copo.
Mas dessa vez ele se concentrou em não sair do lugar, em não vomitar em cima do balcão. Ficou vermelho, lágrimas corriam do seu rosto e seus pêlos se eriçaram.
Era pior do que as outras, mas pelo menos essa ele conseguiu segurar dentro do estômago.
Esperou um pouco para ver o que acontecia.
...
Nada. Nada? Não pode ser! “Mais uma, por favor”.
Mais uma e lá foi ele virar o copo de novo.
Estranho, agora ele estava se sentindo quase durão. Decidiu pedir mais uma.
Virou o terceiro copo. Então era isso o que acontecia? Ele estava gostando, e pensou por que demorou tanto pra fazer isso. Checou a cintura para ver se havia alguma arma lá. Claro que não.
A quarta desceu macia...
Mas na quinta ele caiu do banquinho.
E na sexta desmaiou.
Morreu feliz por ter tentado.

DIÁLOGO

- Deus?
- É, Deus.
- Nunca ouvi falar.
- É quem criou eu e você, criou o céu e a terra e todas as coisas que existem nela.
- Interessante, mas nunca ouvi falar. O que mais ele fez?
- Bem, pra começar ele fez o céu e a terra eu e você e tudo o que tem nela...
- Isso você já falou.
- Em seis dias.
- Poxa! E eu que demorei nove meses pra nascer.
- E ele também tudo sabe, tudo vê e está em todos os lugares e momentos de nossas vidas.
- Então cadê ele?
- Você não pode vê-lo, mas ele está aqui sim.
- Pra mim isso não parece grande coisa. Se bem que muitos de meus amigos têm o hábito de falar sozinhos. Estariam eles falando com Deus?
- Não, eles bebem demais e são loucos.
- E vocês não?
- Não.
- Não e...
- Não e ponto final.
- Sei... Então, de onde você falou que era mesmo?
- Da igreja, e minha missão na Terra é ajudar os outros a seguirem o caminho de Deus e Jesus Cristo.
- E quem é esse outro?
- É o filho de Deus. Nós o matamos e...
- Eu nunca matei ninguém!
- Ele veio pra Terra para perdoar nossos pecados, mas acabou morrendo na cruz.
- Credo. Mas peraí, se o pai dele sabe de tudo e pode tudo, por que ele deixou isso acontecer com o filho dele?
- Ele é Deus, ele pode tudo. Não devemos questioná-lo. Ele escreve certo por linhas tortas.
- Pra mim isso é estupidez. Ele me parece um tanto quanto sádico. Quer um gole? Está frio pra burro e é ótimo para se aquecer.
- Não bebo, isso é errado.
- É?
- É sim, e se você não quiser queimar no inferno é melhor me seguir e ir direto pra igreja.
- De inferno eu já ouvi falar, é um lugar ruim, mas duvido que seja pior do que esse pedaço de calçada. Por isso eu bebo, quando bebo eu me sinto no paraíso, esse você conhece, certo?
- É pra onde todos queremos ir.
- Então meu céu e inferno são aqui mesmo, um do lado do outro e minha única salvação é essa garrafa de pinga.
- Só Deus é a salvação!
- É mesmo? Não fiquei nada impressionado com o que você me contou dele, pra mim ele não parece grande coisa. Tudo o que eu preciso se encontra nessa garrafa, e se eu não encontrar, bem, eu compro outra.
- ...
- Que foi?
- Tô pensando.
- É só o que eu faço todo dia, além de pedir esmolas, claro.
- Me passa a garrafa?
- Mas você falou que não bebia.
- Mudei de idéia, e me dá um pouco desse cobertor que tá um puta frio aqui.
- Claro!
- E você pode pedir pro seu cachorro parar de cheirar minha bunda?

FELICIDADE MATA

A coisa toda só havia piorado.
Desde a última vez em que a vira, tudo só piorou.
Tem comido pouco, dormido mal, o olhar agora é vago e parece meio embaçado, embaçado como vidro fosco.
E isso preocupava a todos, menos a ele. Cedo ou tarde a coisa deveria passar, afinal tudo passa, como Nelson Ned já dizia.
Mesmo assim desistiu de muitas coisas, mas sobretudo desistiu de tentar, e isso para muitos era o fim do poço, mas para ele era só o começo, sabia que a coisa sempre poderia piorar.
Mas não melhorar. Se melhorar muito, a coisa se torna perfeita, e a perfeição é algo a se buscar, mas nunca alcançar.
Como a felicidade.
Ele já conhecera muitas pessoas que se sentiam felizes, que se julgavam perfeitas, mas isso era algo que ele não queria pra ele, sabia que se as pessoas tivessem um senso crítico igual ao dele coisas ruins aconteceriam.
Como suicídio, por exemplo.
Ele sabia que se um dia se tornasse feliz, nada mais valeria a pena, a coisa não poderia ficar melhor.
Melhor não fica, mas pior, bem, acho que ficou claro que pior sempre dá pra ficar.
Por isso que seguia vagando, sem rumo nem direção, pois ele sempre achava que quem não soubesse pra onde ia, qualquer lugar serviria.
E bebia muito.
Isso lhe dava algum prazer, mas nada era perfeito, afinal não tinha a mulher de seus sonhos como uma vez tivera. Estranho, mas agora pensava que quando a tinha faltava alguma coisa, mas agora sabia que era feliz naquela época. Ficou contente de descobrir isso agora, pois isso salvou-lhe a vida, se tivesse essa consciência antes, já teria se matado.
E ficou assim durante algum tempo, até o dia...
Até o dia em que o telefone tocou.
- Alô?
- Alô, Daniel?
- Eu mesmo. Quem fala?
- Shirley, lembra de mim?
...
Ele engasgou com o coração que saltou-lhe à boca.
- Sim, sim, claro!
- Tudo bem?
- Tudo sim, e você?
- Vou bem... Nossa já faz tanto tempo, tenho tantas novidades.
- Bem, eu acho que continuo na mesma, quer dizer, ainda vivo.
- Não sei, pensei muito antes de te ligar. Sabe, eu gostaria de saber se a gente podia se ver um dia desses... colocar as coisas no lugar e, quem sabe, relembrar os velhos tempos...
- Quer saber de uma coisa?
- O quê?
- Vá se foder, sua puta!
E desligou o telefone, ele não estava preparado para o suicídio, não ainda.
Sabia que se voltasse, a coisa poderia se tornar perfeita.
Felicidade é algo traiçoeiro.
E muitas vezes leva à morte.

GANHANDO O OSCAR EM TRÊS ATOS

1
- Infelizmente o Sr. Daniel não pôde comparecer ao recebimento, mas ele nos enviou uma carta:
“Senhoras e Senhores:
Me desculpem por não comparecer ao show de vocês, mas pra mim esse prêmio não vale merda nenhuma. Eu passei o que passei não para no final receber um Oscar, e sim porque eu tinha que sobreviver e escrever era o melhor que eu sabia fazer.
Minha alma tem preço, e não será por uma droga de estatueta que só serve pra impressionar as visitas que eu vou vendê-la. Se fosse por uma garrafa de whisky eu já teria ido.”
- Eu não sei o que dizer...

2
- Eu quero agradecer a presença de todos aqui hoje. Também quero agradecer aos fãs que me ajudaram a chegar até aqui. Na verdade eu só quero agradecer aos fãs que de alguma forma me deram bebidas, e aos que não deram, bem, você ainda têm tempo.
Quero agradecer também a iniciativa de algumas pessoas que mudaram a premiação do Oscar de uma simples estatueta, que só servia pra impressionar as visitas, para uma grandiosa garrafa de whisky, e vejam!, é um whisky dezoito anos!

3
- Obrigado pela presença de todos. Eu só queria dizer que é uma honra estar aqui hoje. Quero agradecer aos meus fãs que me apoiaram durante todos esses anos e minha família que sempre me ajudou em tudo.
Para alguns isso aqui é só uma estatueta pra impressionar as visitas, mas pra mim isso é um sonho que finalmente se realizou. Agora é sério gente, cadê minha garrafa de whisky? Vocês me prometeram uma.